quarta-feira, 12 de maio de 2010

O TOQUE VIRTUAL DIANTE DO AMOR E DA VIDA





Vivemos a Era Virtual. A Contemporânea começou seu fim com a construção do primeiro computador.
A partir daí a automatização de tudo foi crescendo em ondas cibernéticas co-lossais.
Não precisamos mais fazer ou comprar pão (alimento histórico, bíblico, simbó-lico) apenas programamos uma máquina e na hora que desejarmos ela expurgará pão quente e cheiroso para o café da manhã, tarde (um tanto obsoleto) ou da madrugada. Esta, cada dia mais extensa, nós cada vez mais insones, estressados, indormidos.
O pão vivo do espírito nos é servido em CDs em todas as linguagens possíveis de Deus. Algumas inventadas. Afinal não carece de assinatura do Divino.
Vinte e quatro horas por dia as rádios e as televisões rezam, oram ou profanam. Não é o bastante em termos de espiritualidade? Um show de primeira!
A presença de guias, mestres, orientadores tornou-se arcaica, basta ter carisma, um rosto belo, saber cantar, gritar e se balançar ao som de músicas duvidosamente angelicais.
Dormimos ao embalo metálico da TV que se desligará já tendo interferido em nossos sonhos não mais mensagens do inconsciente, mas pasteurizados e controladores de nossas escolhas e necessidades.
Que dizer então sobre os relacionamentos?
A solidão atinge cada vez mais gente, os casamentos desgastados ou impostos, se arrastam e aumentam inexoravelmente na mesma proporção de seu vazio.
O sentimento humano resiste entrincheirado em sua cruel antiguidade e obsole-tismo sob os olhos da geração hay teck. Bate em nossa cara e em nossos corações im-pondo exigências esdrúxulas de aproximação e contato. De eco do outro em nós e de nós no outro.
Estamos na Era Cibernética, conhecemos pessoas ausentes, anônimas e inverídicas nas baladas, nos chats, nos encontros virtuais.
Vez por outra ousamos ouvir suas vozes através do telefone, tendo o cuidado de não revelar o nosso. Se usarmos o celular, outro aparelho que passou a fazer parte de nosso organismo, programamos para aparecer número desconhecido. Ou o Bina nos avisará do inconveniente que clama acreditando ainda em humanidade e solenemente, cheios de razão, não atenderemos.
Alguns, mais audaciosos ou mais ultrapassados se expõem a um contato visual, um sexo de uma hora ou de uma tarde. Sexo virtualmente perfeito, sem face e sem alma.
Robotizamos o parceiro e usufruímos do corpo pretensamente plastificado por nossa imaginação. Depois, falsamente preenchidos, damos as costas. O sêmen jorrado se descarrega como algo espúrio e damos descarga na privada. Liquidada a questão.
Se tivermos o azar de encontrar algo real e tangível, assemelhado à gente, cor-remos a excluir e bloquear. Simples e rápido. Problema resolvido.
A maior parte das vezes nem ao menos nosso nome deixamos impresso na lem-brança, um nick nos afasta de forma protetora e escondida. O distanciamento da perso-na, da intimidade que intimida não fica comprometido.
Quando o corpo clamar novamente ou o vazio bater à porta, recorremos ao pro-cesso e fingimos que ele funciona azeitado.
O que restou?
Isso deixou de ser importante e vital. Coisa do passado romântico, afastar-se dos atritos que nos dão polimento é o objetivo. Atrito incomoda e não temos tempo de ser incomodados.
Os conflitos são empurrados para longe pelo teclado de um computador e nossa alma jorrará em jatos estrobofóbicos nas ondas da Internet.
Sentimentos à vista? Delete.
Ser humano ao alcance? Delete.
Deus vivo falando através de sinais e símbolos? Delete. Idéias, criação, prazer genuíno e vivo? Delete.
Prefira os ícones de sua área de trabalho.
Atual e moderno. Os demais são pertencentes às eras anteriores e ultrapassadas. A poesia agora é concreta.
Sintetize sua alma no twiter.
Beatifique sua imagem no orkut.
Atualize-se: torne-se um morto vivo, representante fiel da nova religião Rapa Nui Virtual & Cia.
Parabéns, evoluímos! Logo, logo as cavernas cibernéticas se abrirão plenamente nos trazendo êxtase de silicone.


Vana Comissoli

NÃO ATRAVESSE A RUA




O dia nasce cheio de fogos
Sou água, sou neve
Sou fogo que derrete
A névoa
A face marcada pelo querer
Transversa
Atravessa
O viver

Na mão o nada
Na tua?
Que tua?
Não existe o outro
Neste momento
Avesso
Sou nua,
Sou crua
Sou faixa de transeuntes

Passam e passam
Cuidado
Vem carro
Não atravesse
Atropelo
Me embaralho

Sou carro?
Sou transeunte?
Apelo
Me chegue
Me baste
Nada me basta sem o outro
Sufoco.

Estou prenhe
Parirei no escuro do quarto
A ternura que é só minha.
Derrubo no espaço
O que era teu.
A dor.

sábado, 1 de maio de 2010

AEÓLIO


Deus dos ventos,
sacode as árvores
até que todas as folhas caiam.
Desmancha a coroa das flores
até que fiquem plebéias e velhas.
Das velhas sopra as perucas
até que se recolham
e se reconheçam bola de boliche
sem pressa de pecar,
morrer ou secar.


Mexe os mares
deixa que a água balance brilhantes de luz
e que as ondas sejam nossa cruz.
Desmascara as bocas de força cruel.
Às cabeças de carretel
oferece morte com sabor de fel

Levanta a saia das mocinhas
quero suas coxas,
suas bundas
E suas vaginas
Tão róseas e lindas.
Tão finas.

Dos homens leve os chapéus
mande todos para o beleléu.
O certo corta em tiras
e serve como recheio de pastel

Tira as roupas do varal
jogue-as no barro.
Mas, por favor, não quebra esse jarro.
É de estimação
De um amigo pedindo perdão

Nessa revolução
apaixonada e causal
está a última esperança
de deixarmos de ser animal.